LEVIATÃ
O universo terá começado
com um grito, e tu vens agora
recolher o que desse grito
é vestígio: é tempo
de enunciar a movediça
explicação que ao desastre
nos conduz.
Nas nossas redes está o Leviatã
apodrecido.Como nos diz Luis Miguel Cintra, no prefácio que preparou para esta edição, «No Hamlet (e a tradução de Sophia torna-o transparente), a progressão da peça segue o processo de amadurecimento do pensamento de uma personagem que à partida é um jovem, um jovem príncipe. As suas descobertas são ainda pueris. Acaba quando percebe o que é o tempo e a morte e a responsabilidade individual, sempre perturbado com a confusão dessa responsabilidade com qualquer coisa que se lhe opõe: o poder. Aí a sua reflexão torna-o adulto, torna-o exemplar, torna-o simbólico.»Inserido na série dos livros já editados com o subtítulo Livro de Horas, resultantes da transcrição dos cadernos manuscritos inéditos de M. G. Llansol, este volume reveste-se de um interesse particular uma vez que se orienta para a construção de uma figura maior na sua obra — a figura de Aossê ou AOSSEP, anagrama de Pessoa, que resulta da leitura e escrita que esta fez do poeta Fernando Pessoa, ao longo de toda a sua vida literária.
São cerca de trinta anos de escrita, muitas vezes diária, com vista à transformação e reconstrução da figura do poeta Fernando Pessoa, figura maior da cultura portuguesa, e aquela que mais tempo convive com Llansol. Projetada em muitas centenas de páginas manuscritas, a figura de Pessoa-Aossê, presente em metade dos livros publicados de Llansol (em 12 dos 24 publicados), continua, assim, ainda hoje largamente desconhecida no que se refere ao amplo «projeto pessoano» de M. G. Llansol.
Este Livro de Horas V resulta do levantamento exaustivo, seleção, ordenação cronológica e transcrição da totalidade dos manuscritos que, não tendo entrado em livro, permanecem ainda inéditos.
O protagonista desta história, Enric Marco, é um nonagenário barcelonês que se fez passar por sobrevivente dos campos nazis e que foi desmascarado em maio de 2005, depois de presidir durante três anos à associação espanhola dos sobreviventes, de dar centenas de conferências, de conceder dezenas de entrevistas, de receber importantes distinções e de comover (nalguns casos até às lágrimas) os parlamentares espanhóis reunidos para, pela primeira vez, prestarem homenagem aos republicanos vítimas do III Reich. O caso deu a volta ao mundo e transformou Marco no grande impostor e no grande maldito. Agora, quase uma década depois, Javier Cercas persegue neste thriller hipnótico o enigma da personagem, a sua verdade e as suas falsidades. E através dessa investigação, que percorre quase um século da história de Espanha, mergulha com uma paixão de kamikaze e uma honestidade dilacerante nas profundezas de todos nós: na capacidade infinita que temos de nos enganar a nós próprios, no nosso conformismo e nas nossas mentiras, na nossa sede insaciável de afeto, nas nossas necessidades contraditórias de ficção e de realidade, nas zonas mais dolorosas do nosso passado recente. O resultado é o livro mais insubmisso e radical de Javier Cercas: um livro assombroso que, com uma audácia inédita, alarga os limites do género romanesco e explora as últimas fronteiras da nossa humanidade.
sexta-feira, 30 de outubro de 2015
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