Vivemos hoje, individual e colectivamente, lucida ou inconscientemente, as consequências das nossas opções. Quando estas consequências são boas, todos reivindicam um papel, quantas vezes a despropósito. Quando elas são más, não aparece ninguém a assumir responsabilidades. Pelo contrário, todos as enjeitam, escondendo-se atrás do inesperado, como se de repente uma ordem sobrenatural – a crise, claro! – se abatesse sobre a humanidade. Assim entendida, a crise corre o risco de conduzir a uma inquietante irresponsabilidade, passando-se ao lado do essencial, que é – quer se trate do autismo financeiro ou do desastre ecológico, do impasse económico ou do susto social – o realista confronto connosco próprios.
É esse conforto que, em De olhos bem abertos, Manuel Maria Carrilho propõe que se faça, defendendo uma urgente mudança de perspectiva e de paradigma. Mas para que isso aconteça, é fundamental que se compreenda a verdadeira novidade desta crise, tanto quanto à sua natureza como quanto às suas consequências. Este passo, contudo, dificilmente será dado pelos protagonistas, e com as ideias, que conduziram à actual situação.
É preciso outro espírito, que combine realismo e utopia, são necessárias outras visões, outras instituições e outros gestos, que não sejam de pura retórica, como acontece com vagas promessas de um crescimento «mais verde», «mais sustentável» ou «mais tecnológico». Como diz Mia Couto, este «desenvolvimentês» tornou-se na linguagem do engano mais comum, porque fala do que na verdade é incapaz de pensar. E, assim, mantém os que a ouvem reféns de tudo aquilo que conduziu à crise quando, justamente, do que se precisa agora é de mudança de expectativas e de comportamentos, de linguagem e de valores.
quinta-feira, 20 de outubro de 2011
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